26 de out. de 2007

Ruptura

Videoclipe de mau gosto

Ruptura insulta a inteligência do espectador ao substituir competência cinematográfica por um vídeo a-la-MTV e ainda se levar a sério

STEFANIE GASPAR
O FINO DA MOSTRA


Ruptura conta a história de Nia, um jovem que se envolve em uma briga e resolve vingar a morte de seu amigo Pulpo, ferido gravemente pelo líder de uma gangue rival, Spirit. Após a briga, Nia é mandado para uma prisão juvenil, na qual se passa grande parte do filme.

Estereótipo do filme de "mano" que tenta a todo custo ser descolado, Ruptura caracteriza-se pelo visual pretensiosamente arrojado e violento (como metáfora do mundo imprevisível das ruas) e pelo vocabulário lotado de gírias, que parecem surgir mais de um “afetamento” da linguagem natural da periferia do que de um retrato fiel ao universo dos jovens.

O filme faz questão de ressaltar o lado herói de Nia, que mesmo em sua condição de marginalidade consegue ainda preservar certos "princípios". Ele é o arquétipo típico do herói que faz coisas erradas (rouba, é agressivo, etc) mas no final é capaz de se redimir (com a dança em vez do assassinato), principalmente por amor (e essa é a única utilidade do personagem da promotora). É a trajetória de todo herói hollywoodiano, aqui repetida nos mesmos moldes. Ironicamente, não há nada menos glamouroso e hollywoodiano do que o verdadeiro cotidiano das ruas.

Apesar de ser retratado com certa superficialidade, Nia é carismático, o que ajuda o filme a conseguir certa empatia. Os demais personagens, entretanto, são tão estereotipados que é impossível levá-los a sério. O garoto socialista do centro de recuperação é o exemplo mais emblemático desse clichê: em todos os momentos possíveis ele fala algo como "Porcos capitalistas!" e coisas do gênero. A narrativa faz questão de utilizá-lo extremamente mal, dizendo que ele chegou ao centro por atirar coquetéis molotov (maior clichê comunista não há) e por rebeldia, que ele é o único que lê algo e só escuta no rádio emissoras ligadas ao socialismo, etc.

Mesmo tentando a todo custo ser um filme "descolado", Ruptura é moralista e clichê ao extremo. O final, que elege a dança e a música como possíveis “salvações” para Nia é de um didatismo enorme. Lição de moral é cinematograficamente insuportável, principalmente porquê o filme tenta construir uma narrativa que vê Nia e seu grupo com compreensão, mas no final simplesmente afirma, com arrogância: OK. Nós entendemos vocês e os achamos simpáticos, mas prestem atenção, porque nós temos as soluções para a marginalidade! A narrativa paternalista tira toda a graça que o filme teria se apenas apresentasse as situações em julgá-las.

O filme deixa de lado muitas questões que seriam muito interessantes, como o caso do melhor amigo de Nia dentro do reformatório. Ao mesmo tempo em que o garoto possui e obedece ao código de honra das ruas, ou seja, não dedurar nem fraquejar, ele tem uma moral estranha: ao ver a promotora que está tentando ajudar Nia, ele tenta estuprá-la, coisa que Nia, de acordo com a narrativa, jamais faria. O filme, entretanto, deixa essa questão de lado, em vez de aprofundar os paradoxos das situações dos internos.

A música é usada com muito mau gosto, já que parece visar afastar a atenção do espectador das imagens fracas que o filme oferece. Entretanto, a trilha sonora é contagiante e dá uma ótima sensação no final da projeção. O ritmo musical agradável acaba maquiando os inúmeros problemas do filme. Em muitos momentos vemos Nia, durante a noite, dançando em seu quarto, cena que se repete várias vezes e praticamente é o símbolo do filme. É como se todo o filme fosse um enorme vídeo clipe que antecede a seqüência final, a da vitória pela dança. E tudo que vem antes, na verdade, não tem muita importância.


RUPTURA
(Breakout, Suíça)
Direção: Mike Eschmann
Perspectiva | 2006 | 94 min

21/10 | 14:00 - Memorial da América Latina
28/10 | 12:40 - HSBC Belas Artes 2
31/10 | 19:40 - Cine Bombril 1

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