25 de out. de 2007

Garçom

A história pela história

Provando que nem só de amolações intelectuais é feito o cinema, Garçom recorre à simplicidade que dá certo

MARIANA PASINI
ESPECIAL PARA O FINO DA MOSTRA


Garçom muito provavelmente vai passar despercebido nessa 31ª Mostra. Nada de tramas que não fluem, questionamentos sem respostas ou pontos de vista obstinados. O filme do holandês Alex van Warmerdam não conta com grandes expectativas por parte da crítica e sequer tem ambições muito maiores do que contar uma história, ou melhor, a história de uma história – e é esse o seu ponto forte.

O próprio diretor encarna na pele de Edgar, homem de 50 anos que exerce a profissão declarada no título. Uma esposa doente o espera em sua casa, mas ele mantém um caso desgastado e fadado ao fim com a irritante Victoria. Edgar deseja sair de uma rotina que varia entre um tédio surreal e uma série de mal tratos contra os quais ele não faz nada. Nada muito diferente do esperado de um personagem de um longa com pretensões de ser alternativo. A variante do caso de Edgar é que ele tem acesso à pessoa que controla sua vida.

Herman é o roteirista que desenvolve os acontecimentos pelos quais passa o garçom, que chega a procurá-lo em sua casa, revoltado com o rumo que estão tomando. A esposa do escritor, Suzie, arruma grandes conflitos com o marido por conta de suas opiniões sobre o texto e muitas vezes também das modificações que nele empreende. A grande sacada metalingüística do filme não é muito original. Impossível não citar Mais Estranho que a Ficção, do diretor Marc Forster com o impagável Will Ferrell, para comparar. Porém, o longa faz mais experimentações no campo do surreal, dispensando papos-cabeça filosóficos sobre a vida e seu sentido – ou a falta dele. O espectador agradece.

Num humor pastelão que nunca falha, Edgar é agredido por vizinhos mafiosos, insultado pelos clientes no restaurante, atormentado pela amante carente, forçado a esperar minutos intermináveis para que o atendente embrulhe seu pedido. O modo pelo qual o criador trata sua criatura – que transita pelas vias do desprezo e da raiva – chega a ser cômico. O garçom é submisso até na hora em que reclama episódios mais prazerosos para o roteirista. Ele chega a conceder-lhe momentos agradáveis (mas que não duram muito) com Stella, uma mulher misteriosa.

Herman, a princípio indeciso sobre o destino de Edgar, admitindo o desastre cinematográfico que a narrativa constitui, não hesita em aplicar-lhe um fim trágico, que parece ter sido solicitado apenas para acabar com o tormento que foi escrever aquela história.

A grande vitória de Garçom está em provocar idéias no público. Van Warmerdam não convida ninguém a entrar na tela e decidir a sorte de seu personagem, mas compõe as cenas de modo que seja impossível não indagar-se sobre o futuro a ser dado ao dócil e sofrido garçom. Sem querer, o longa acaba lembrando que também os filmes podem ter os seus momentos de arte pela arte. Pelo singelo prazer de pensar e narrar uma história, é um cinema que dá vontade de fazer cinema.


GARÇOM
(Ober, Holanda)
Direção: Alex van Warmerdam
Perspectiva | 2006 | 97 min

20/10 | 19:00 – Memorial da América Latina
24/10 | 12:40 – HSBC Belas Artes 2
30/10 | 18:30 – Cine Bombril Sala 2

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